quarta-feira, 30 de setembro de 2020



Ruídos na comunicação

         

          Comunicar, já escrevia Izidoro Blikstein na página 20 de seu livro Técnicas de Comunicação                  Escrita (1985), é tornar comum um pensamento. Entretanto, alguns fatores podem dificultar ou              impedir que a comunicação se processe a contento. Esse fato ocorre quando surgem os chamados            ruídos.

          É do mesmo Blikstein a definição que segue:

Ruído: interferência de ordem física, psicológica ou sociocultural que provoca uma descodificação e uma resposta não esperada ou não desejada pelo remetente. (1985:94)

 No livro Linguagem Jurídica e Argumentação (2014:86), Trubilhano e Henriques retomam esse conceito e tratam-no da seguinte forma: todo e qualquer obstáculo que impeça a atividade de comunicação.

Acrescentam os autores que pode haver ruído a partir de qualquer um dos elementos da comunicação, ou seja, do emissor, do receptor, da mensagem, do código, do canal ou do referente.

O obstáculo diz respeito ao emissor, por exemplo, se este não for capaz de compor uma mensagem de forma clara e compreensível para seu interlocutor. É o que pode acontecer, por exemplo, com alguém que se encontre sob forte emoção e que necessite falar sobre o fato que o abalou tão profundamente. Com certeza, a mensagem se apresentará truncada, crivada de interrupções que dificultarão o entendimento. Ou, pense-se ainda no caso de qualquer profissional – seja da medicina, do direito, da engenharia, do mecânico de automóvel - que produza um discurso, falado ou escrito,  cujo teor seja incompreensível a quem ele se dirige.

Mas o ruído se concentrará no receptor se ele se mostrar indiferente às palavras do enunciador, se não apresentar nenhum esforço que vise entender o texto enviado ou se não tiver um repertório capaz de fazê-lo entender o que está sendo transmitido. Imagine alguém que se proponha assistir a uma palestra sobre aprofundamentos da física quântica se não possui subsídios que lhe possibilitem entender o que o palestrante expõe.

O ruído poderá ser atribuído ao código caso este não for comum aos dois interlocutores: se alguém quiser pedir uma informação em chinês a um brasileiro, seu objetivo só será atingido se o brasileiro tiver algum conhecimento de mandarim. Caso contrário, a comunicação não se efetivará. Da mesma forma, o emprego de um jargão profissional quando se fala a um leigo matéria não levará a um efetivo ato de comunicação.

Imagine-se agora uma situação em que um doutor em astronomia esteja empenhado em transmitir seus conhecimentos a uma criança de sete ou oito anos. Evidentemente, não será possível um intercâmbio, uma vez que os referenciais dos dois interlocutores são muito distantes um do outro. Nessas circunstâncias, o ruído está atrelado ao referente.

Por seu turno. falhas no equipamento de informática, por exemplo, poderão impedir a continuidade dos trabalhos de cientistas ou professores que estudam, a distância, um mesmo problema. Nesse caso, a comunicação seria suspensa, não se efetivaria. Ou, em outro exemplo, a falta de energia elétrica geraria problemas em uma transmissão radiofônica, que necessita da eletricidade para se efetivar. As citadas são situações em que o ruído se localiza no canal que estaria possibilitando a comunicação

Por fim, aparecerão dificuldades se a mensagem for produzida sem considerar o repertório do enunciatário. Um texto criado nessas condições – muito complexo e  dirigido a quem tem escolaridade básica; com linguagem ultrapassada e direcionado a um jovem; crivado de expressões técnicas e endereçado a um leigo, por exemplo – impedirá a efetivação do ato comunicativo.

Mas é necessário considerar, ainda com Blikstein, que, por vezes, o ruído pode apresentar um efeito positivo. É o que ocorre quando ele é utilizado como elemento de impacto ou surpresa (:94), causando uma quebra na expectativa do interlocutor. É um recurso empregado pela publicidade, pelo jornalismo, pela literatura quando têm em mente chamar a atenção do outro. Veja-se o texto produzido por um shopping center curitibano na época do Dia das Mães, ocasião em que, entre os clientes, sorteava-se uma perua Wolkswagen, modelo Parati:


                        Este carro é Parati, mamãe.

Nele o emprego da maiúscula e a grafia fora dos padrões da norma culta – o esperado seria para ti, mamãe – geram uma ambiguidade, criam o estranhamento,  despertam o riso, mas chamam a atenção para o sorteio do carro.

Dessa formar, os ruídos, como muitas outras facetas da linguagem humana, revelam o aspecto multifacetado que ela possui, responsável por sua opacidade mas também pelo seu fascínio.

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Referências:

BLIKSTEIN, Izidoro. Técnicas de Comunicação Escrita. São Paulo: Ática. 1985.

HENRIQUES, ANTÔNIO & TRUBILHANO, Fábio. Linguagem Jurídica e Argumentação. São Paulo: Atlas. 2014.