quinta-feira, 7 de agosto de 2014

A pesquisa sociolinguística




Embora muitos cometam o engano, a pesquisa sociolinguística não é uma atividade simples de ser executada. Um trabalho desse gênero, se se pretende bem feito, requer muitos passos e cuidados.
Inicialmente, é preciso ter em mente que existe uma relação entre língua e sociedade, pois o desempenho linguístico não está dissociado da pessoa que fala, da pessoa com quem ela fala; do momento que vive nem lugar em que está. Esses fatores fazem com que o objeto de estudo da pesquisa, isto é, as relações língua e sociedade, seja bastante heterogêneo. Aparentemente caótico, ele precisa ser sistematizado, o que requer atenção e seriedade de trabalho.

Outro problema que se coloca é a delimitação do campo de pesquisa, ou seja, a escolha da célula social a ser analisada já que é impossível, de uma só vez, examinar a fala de toda uma sociedade.

Aspecto mais delicado é a seleção do informante. Quando o objetivo é determinar as características da fala de uma comunidade primitiva, pouco exposta às mudanças do mundo moderno. por exemplo, o cuidado deve ser maior, porque, nesse caso, o informante deve ter nascido na região, não pode ter se ausentado dela por muito tempo nem tido muito contato com pessoas de outras comunidades, capazes de alterar sua forma de expressão.

Recolher os dados requer, igualmente, cuidados especiais. Recomenda-se que o pesquisador deixe o informante à vontade e não lhe diga, de início, que a conversa visa a estudar sua fala. Tal declaração poderia despertar a desconfiança de que seriam apontados “erros” de língua, e o pesquisado, diante dessa hipótese, se esforçaria para adequar sua fala ao padrão culto da língua, falseando dessa forma os dados a serem recolhidos.1

Os estudiosos recomendam que, para fazer com que o entrevistado se sinta à vontade, seja-lhe solicitada a narrativa de alguma experiência pessoal. Assim, preocupado em ser fiel a sua memória, será mais difícil que ele não se esforce por aclimatar sua forma de expressão àquela usada pelo pesquisador ou por alguém escolarizado.

Esses cuidados fazem com que o observador viva, com freqüência, uma situação paradoxal: ele precisa participar da comunidade para coletar o maior número possível de dados mas, ao mesmo tempo, não pode perturbar a naturalidade do encontro.

Feito o recolhimento dos dados, o pesquisador deverá descrever  cuidadosamente a variável em exame para que ela possa ser inserida em pesquisas de caráter mais amplo, interessadas, por exemplo, em construir o mapa linguístico de uma região.

Nos trabalhos mais complexos, há outras tarefas a serem cumpridas, como elaborar envelopes de variação – de que devem constar descrições das variantes estudadas -, identificar os fatores linguísticos e não linguísticos 2 que agem sobre as variantes, projetar as transformações que, em uma dimensão histórica, podem ocorrer sobre uma fala entre outras.

Se houver interesse em obter mais informações sobre o assunto, recomenda-se a leitura de um pequeno livro de Fernando Tarallo, A pesquisa sociolinguística, que faz parte da série “Princípios”, organizada pela editora Ática.

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1 Na verdade, o padrão culto da língua é a variante que menos interessa à pesquisa sociolinguística devido a seu caráter homogêneo. Por ser a norma oficial, a empregada na comunicação de todo o país, ela não apresenta as particularidades que as demais variantes oferecem.
Como exemplo de um fator linguístico que pode influenciar uma variante, podemos citar a pronúncia do /l/ em final de sílaba: em alguns contextos, o fonema é emitido como consoante, caso do Rio Grande do Sul; em outros, ele é articulado como a semivogal /w/, o que ocorre em São Paulo.  
Escolarização, idade, sexo podem ser citados como fatores não linguísticos capazes de agir sobre a fala de um indivíduo.




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