segunda-feira, 7 de julho de 2014

Oralidade e escrita

          O espírito humano parece ser ávido por criar dicotomias: ou elas se instalam na oposição espiritualidade x materialismo; ou na razão x sentimento; ou na natureza x cultura. Em cada uma delas, quase sempre, há quem penda mais para um lado que para o outro.

      Naquela que se criou entre língua escrita x língua oral, a preferência dos estudiosos recaiu, por muito tempo, sobre a modalidade escrita. Eles se apoiavam no argumento segundo o qual esta deveria ser considerada um aperfeiçoamento daquela e, portanto, merecedora de mais atenção. De seu ponto de vista, a estrutura da escrita era complexa, abstrata – quase independente de um contexto - e formal; a da outra apresentava-se como um avesso: seria simples, concreta, informal, amorfa, sempre submissa a um momento.

          Escrevem Fávero et al, no livro Oralidade e escrita: perspectivas para o ensino da língua materna (Cortez: 2005), que a fala era vista como uma forma primitiva, e a escrita, como sua derivada de maior prestígio. E lembram:

Historicamente a escrita, sobretudo a literária, sempre foi considerada a verdadeira forma de linguagem, e a fala, instável, não podendo constituir um objeto de estudo.

       Ultimamente, todavia, muitas pesquisas têm se desenvolvido acerca das duas formas de expressão. O grande volume de publicações, entretanto, não revela convergência no modo de equacionar o problema, pois ainda se evidencia, em alguns casos, a manutenção do mesmo maniqueísmo:  alguns, que se utilizam do argumento de que os homens aprendem a falar antes que a escrever, sustentam ser a fala mais importante que a escrita; outros, apoiando-se na projeção – ou status - que possuem os povos que se servem do registro escrito da língua, garantem ser este uma forma superior de expressão.

          Pontos de vista mais equilibrados buscam uma solução intermediária. Para essas posições, é preferível acreditar que, apesar de ambas as modalidades servirem-se do mesmo sistema linguístico, elas fazem um uso diferenciado dos recursos que têm à disposição. Assim, cada uma dá origem a um produto específico, distinto do da outra, mas não menos relevante.

         Partindo desse princípio, estudos recentes têm demonstrado, por exemplo, que os textos orais também apresentam marcas de coerência e coesão ainda que de forma muito diversa do que aquelas encontradas em sua contrapartida escrita.


        Se há interesse em aprofundar esse tipo de conhecimento, consulte-se, entre muitas outras, a obra do professor pernambucano Luís Antônio Marcuschi; os estudos publicados pelo projeto Gramática do Português Falado no Brasil, coordenado por Ataliba Castilho; os trabalhos de Dino Preti ou os organizados por Maria Helena de Moura Neves, que tem se dedicado também a organizar uma gramática do português oral.         

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