Torna-se desnecessário dizer que as
sociedades humanas começaram a se comunicar por meio da oralidade. O instigante
é procurar saber a partir de que momento elas passaram a se interessar pela
escrita. Mary Kato, em seu livro No mundo
da escrita: uma perspectiva psicolinguística (Editora Ática.1990), apoiada
nos estudos de Gelb, faz uma retrospectiva, que será retomada aqui de forma
sucinta.
De acordo com suas informações, podemos
dividir o desenvolvimento da escrita em duas grandes fases: a dos movimentos precursores e a da escrita plena. Na primeira, também chamada semasiológica1,
verificaram-se produções relacionadas ao sistema pictográfico: objetos eram
desenhados pelos homens primitivos sobre uma superfície qualquer com o objetivo
de expressar visualmente suas idéias.
Gradativamente, esses desenhos tomaram
duas direções: uma delas se encaminhou para a manifestação artística e a outra
destinou-se à comunicação. Naturalmente o sistema pictográfico, de início, não pode
ser considerado como uma representação da fala mas, aos poucos, passou a
desempenhar esse papel.
Ao lado da pictografia e ainda relacionados aos movimentos
precursores da escrita, encontram-se os recursos mnemônicos, caso dos
símbolos heráldicos2 e dos registros empregados pelos indígenas para
indicar as condições do tempo: eles faziam, por exemplo, pela distribuição de
pedras sobre o solo.
Na fase da escrita plena, também designada como fonográfica, ou seja, aquela que
registra (grafia) o som (fono), podem ser identificadas as seguintes etapas: lexical-silábica,
silábica e alfabética.
Ao examinar a etapa lexical-silábica, os pesquisadores
constataram uma simplificação no traçado dos desenhos usados na pictografia, o
que permitiu que eles pudessem ser submetidos a convenções: os mesmos traços
passaram a representar sempre as mesmas ideias. Surgiram então os ideogramas
(ou logogramas) e os desenhos deixaram de ser icônicos, ou seja, relacionados à
imagem e passaram a ser simbólicos. Por exemplo, ao invés de desenhar um
animal, fazia-se um traço que o representasse.
O logograma já pode ser considerado
uma palavra, pois possui uma representação fonética – ligada a um som - e um significado.
Essa forma de escrita se manteve em uso por muito tempo e eram prestigiados os
povos que se serviam dela.
Foi o espírito pragmático dos
fenícios que extraiu da escrita lexical-silábica dos egípcios – derivada dos
hieróglifos – vinte e quatro símbolos que vieram a formar um silabário. De início, esse silabário era
constituído apenas por consoantes, sendo as vogais apenas esporadicamente
empregadas para indicar alteração na leitura de um símbolo. Por exemplo, /f/,
poderia ser lido como /fa//fe//fi//fo//fu/. A língua japonesa é uma, dentre as
faladas no mundo contemporâneo, que conserva o sistema silábico de escrita.
Os gregos se apropriaram do silabário
fenício para formar o alfabeto, empregado por grande número das línguas
modernas. Os helenos padronizaram o uso da vogal associada a uma consoante,
o que fez com que a escrita silábica passasse a ser alfabética. Esses fatos
ocorreram no século X a.C.
Kato informa que, depois da transformação da
escrita silábica em alfabética, nenhuma alteração significativa aconteceu na
história da escrita. E acrescenta:
Embora haja inúmeras variedade de
alfabeto no mundo, que apresentam
diferenças formais externas, todas ainda usam os mesmos princípios estabelecidos
pela escrita grega (1990:16).
Antes de encerrar, leia uma curiosidade
acerca do aprendizado da escrita pela criança: segundo Vogitsky, que estudou o
assunto, para aprender a escrever, uma criança precisa, antes de qualquer coisa,
descobrir que ela pode desenhar, ao lado de outras coisas, a própria fala.
Para representar a evolução da
escrita, Kato apresenta (1990:13), ainda com base em Gelb, um esquema que
reproduzimos aqui:
1.
Inexistência
da escrita
2.
Precursores
da escrita: fase semasiológica
2,1, Sistema pictográfico
2,1, Sistema pictográfico
2.2.Recursos de identificação mnemônica
3.
Escrita
plena: fase fonográfica
3.1.Lexical-silábica
3.2.Silábica
3.3.Alfabética
_________________________________________
1
Semasiologia é uma palavra proveniente do grego e formada
por semasía, termo relacionado ao
conceito de significado + logos = estudo + ia. Trata-se de um ramo da
lexicologia, ou seja, do estudo do acervo das palavras de uma língua. A semiologia
focaliza o significado dos vocábulos e dele retira os significantes.
2Heráldica: estudo dos brasões.
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